Filosofia aplicada - Não à Tolerância!

| Artigo de Opinião |

Ser tolerante... “Ser tolerante é bom”...
Não. Não necessariamente pelo menos. Se uma ideia não faz sentido (é estúpida, digamos assim), eu não vou concordar ou validar, só porque quero ser alguém respeitador (“respeitar todas as ideias”).

No seguimento da crónica da crise de identidade, e inspirado no paradoxo da tolerância de Karl Popper e no conceito da luta contra a opressão de Simone Beauvoir, quero vos propor uma pequena reflexão:

1. Se nós não temos uma opinão suficientemente fundamentada acerca de algo, não temos obviamente de a exprimir, muito menos impor. Faz sentido.
Contudo, se nós temos alguma base (fundamentação) para poder debater um assunto com alguém, podemos, de forma perfeitamente respeitadora, concordar ou discordar e explicar porquê.

 

2. Com os nossos pacientes, e tendo em consideração alguns princípios éticos, nós nem sempre podemos exprimir as nossas ideias/crenças (neutralidade), mas não precisamos de validar o que a pessoa diz, sobretudo se vai contra algumas ideias/princípios de cidadania: racismo, xenofobia, descriminação com base no género ou orientação sexual, descriminação com base nas crenças religiosas e opiniões política, descriminação com base na idade, condição de saúde, etc.

Mas junto dos colegas temos, à partida, maior liberdade de debate, quer seja público ou privado (interno), porque supostamente partilhamos uma linguagem base comum, enquanto profissionais de saúde.

 

Concordam com as premissas anteriores?

Se sim, aqui vai a proposta de pensamento:
- Se não nos opusermos a determinada ideia pública, especialmente se a validarmos (like), estamos, pelo menos de forma pública, a tolerar a mesma (ver definição em baixo).
- E, se tolerarmos publicamente alguma ideia, estamos, ainda que indirectamente, a atribuir alguma legitimidade (social).

Ou seja, se assumirmos que tolerar tudo é bom, porque é bom sermos tolerantes, podemos estar a cair no erro de atribuir legitimidade a ideias que não fazem sentido, sem termos reflectido previamente nelas.

E, ainda mais grave, se não pensarmos no peso da legitimidade que vamos estar a atribuir, podendo estar inclusive a alimentar um problema...! (Ver crónicas acerca da sensibilidade e alienação)


Ser tolerantes, só porque sim?

Não, obrigada.

to·le·rân·ci·a
1. Condescendência ou indulgência para com aquilo que não se quer ou não se pode impedir.
2. Boa disposição dos que ouvem com paciência opiniões opostas às suas.

"tolerância", in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha], 2008-2013, https://dicionario.priberam.org/toler%C3%A2ncia [consultado em 03-07-2019].

 

(Texto recuperado de Julho 2019)