Dignidade - A indignidade da doença

| Artigo de opinião |


A dor, a doença, a disfunção, a necessidade de cuidados de outros, a dependência... Já escrevi outras crónicas sobre isto (crónicas ”a coragem do paciente, ”não quero dar trabalho”, ”continuar...”, ”super-herói”), mas acho que nunca escrevo o suficiente sobre o assunto. Parece que deixo sempre algo importante por referir...

Há uns tempo (não consigo precisar) li uma crónica do escritor António Lobo Antunes, sobre a vulnerabilidade ou a indignidade de se ser doente (não me lembro o suficiente e não consigo encontrar, mas vou deixar a referências de uma outra crónica linda (1)).
Não me lembro exactamente das palavras, mas a sensação delas marcou-me profundamente, especialmente como profissional de saúde:

Não quero jamais que alguém ao meu cuidado se sinta indigno, só por precisar da minha ajuda.

O que é ser digno?

Merecedor, credor, benemérito.
Brioso; pundonoroso; honrado; correcto.
Ilustre; grande; nobre.
Hábil; capaz.
Merecido; correspondente ao merecimento; proporcionado
(2)


Porque é que a doença torna a pessoa tão indigna? Porque a pessoa deixa de ser hábil, capaz...? Deixa de ser merecido, nobre, honrado?
Quem nunca precisou de ajuda? Quem nasceu a ser independente? Não fomos todos bebés, dependentes durante anos?

Isso é indigno? Porque é que em adulto ou adulto mais velho, precisar de ajuda, é sinónimo de indignidade?

A doença até pode ser de uma grande indignidade, sem dúvida, mas o seu portador também é?

Então porque é que às vezes tratamos os pacientes como se eles fossem a sua dor/doença/ condição? Como se a condição da pessoa se apoderasse da sua identidade.
 
Não basta a indignidade da condição, o seu portador ainda assiste a sua dignidade a ser ainda mais reduzida, quando nos esquecemos que el@ é uma pessoa, e não um portador de dor/ doença/ condição.

Por isto tudo, tentem-se ver pelos olhos dos vossos pacientes. E imaginem o que gostariam para vocês. Uma prática honesta, informada, e humana (crónica "não sejas uma besta"), diria eu.


Porque a doença pode ser indigna, mas a Pessoa não.



Por uma questão de sensibilidade...



Referências:
(1) http://visao.sapo.pt/opiniao/opiniao_antonioloboantunes/2018-10-03-O-doente
(2) "digno", in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha], 2008-2013, https://dicionario.priberam.org/digno [consultado em 10-11-2019].


Inspirado conversas cuidadora Tereza Silva.
 
 
(Texto recuperado de Novembro 2019)

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